Cos'è?



martedì 18 agosto 2009

A vida de Norma - JP de Azevedo*

Norma sempre foi considerada uma garota normal dentro de seu pequeno círculo de conhecidos. Alguns atributos e características de sua personalidade, porém, mostravam-na como uma menina um tanto quanto incomum para sua idade.

Aos dezessete anos terminou o colegial. Gostava de ir a teatros, tinha profunda admiração por peças de Shakespeare (talvez o único autor que realmente lhe interessava), gostava de assistir a filmes cults e que normalmente estão fora do circuito comercial. Aliás, detestava tudo que carregava este rótulo de “comercial”, “pop” ou mesmo “teen”, na medida em que tudo lhe parecia vulgar e banal.

Há pouco tempo resolvera entrar em um curso de Teatro, o que acabou por se tornar uma grande decepção: seus professores ignoravam os clássicos e preocupavam-se somente em propor textos de autores contemporâneos, altamente pedantes e que em si não tinham graça nenhuma. Sem contar no tempo que se perdia com exercícios infantis que não serviam para absolutamente nada.

A única coisa que tirou de proveitoso do curso de teatro foi um namorado. Frederico, um rapaz rico, estudante de direito de uma caríssima universidade privada, despertara-lhe o interesse devido à sua visão crítica quanto a problemas realmente relevantes que iam desde questões que envolviam meio ambiente até a estética predominante nas obras de Picasso. Norma ficava encantada quando seu jovem namorado discorria horas a fio sobre seus conhecimentos de botânica, física quântica, Fenomenologia hegeliana... Tinha sensações que equivaliam a verdadeiros orgasmos quando Frederico pronunciava alguma palavra à qual desconhecia o significado “Ontologicamente falando...”

Era essa a vida de Norma: não se considerava uma garota alienada, tinha senso crítico, sabia o que era bom, não tinha problemas com os pais (o que era muito incomum para as demais moças de sua idade), namorava um bom rapaz, estava se preparando para o vestibular...

Contudo, havia algo que sempre lhe importunava. Um sentimento estranho que lhe abatia e que a fazia hora ou outra sentir-se como uma pessoa vazia, desencarnada do mundo real. Parecia que tinha uma existência inútil e que, apesar do que lhe diziam seus pais, ou até mesmo Frederico (quando encontrava tempo para ouvir o que Norma dizia), fazia com que tivesse a impressão de que estava à parte do mundo: ela não o percebia, assim como, ele, o mundo, também não se dava conta de sua existência.

O dia 25 de agosto foi um dia marcante para a história de Norma.

Ela saiu em procura de uma loja de cds em um Shopping qualquer da cidade com apenas uma coisa em mente: Comprar um cd de Tchaikovsky. Era o único compositor erudito que ainda não tinha ouvido e, como Frederico havia lhe alertado sobre as singularidades do repertório deste extraordinário compositor, não teve dúvidas.

Na loja de cds
Norma:
– Bom dia, tem alguma coisa aí de Tchaikovsky?

O vendedor torceu o nariz para a pergunta de Norma:
–Tchaikovsky? Hum... acho que não tenho nada dele aqui não...

Vendedor:
– Mas você pode ficar à vontade, deve haver algo que lhe interesse...

Norma com desânimo começa a circular pela loja, até o momento em que se depara com uma prateleira de cds de rock.

Uma capa lhe chama a atenção: quatro rapazes estranhos com cabelos longos cobrindo os olhos, sob uma inscrição em vermelho R.A.M.O.N.E.S

Norma vira-se para o vendedor e pergunta:
– O que é isso aqui: R.A.M.O.N.E.S ?

Vendedor:
–Você não conhece? É uma dessas bandas punks...

Punk... Norma já havia ouvido essa palavra, mas nunca soube bem o que significava. Uma curiosidade mórbida a impulsionou até ao balcão do vendedor fazendo-a comprar de imediato o estranho cd.

Chegou em casa com a camisa molhada de suor. Não se lembrava de ter em algum momento corrido tanto por alguma coisa. Só o que queria era chegar em casa o mais rápido possível para poder ouvir aquele estranho cd.

Pegou-o com as mãos trêmulas e, antes de colocá-lo no aparelho de som, deu mais uma rápida olhada para a capa. Havia algo ali que a intrigava, talvez o fato de o olhar de peixe morto de um dos integrantes da banda passar a impressão de querer lhe dizer alguma coisa.

Sem mais hesitações colocou o cd no aparelho de som, deitou-se na cama e apertou o play do controle remoto.

Riffs infernais de guitarra começaram a soar entre as paredes do até então tranqüilo quarto de Norma. E como se alguma força estranha agisse sobre seu corpo, começou a levitar sobre a cama até o momento em que se viu de pé agitando freneticamente a cabeça, para cima e para baixo e cantando em línguas estranhas (já que não compreendia o inglês cantado pela banda).

Pela primeira vez Norma sentia o sangue correr em suas veias. Tinha a certeza de que aquele era um momento especial que iria determinar novos rumos em sua vida.

Sem dúvida encontrara o remédio para suas crises de identidade. Depressão nunca mais, pois só uma coisa importava: O Rock’n’roll e, acima de tudo, ser Punk.

Inexplicavelmente sentiu uma vontade danada de se rebelar, por isso, a primeira coisa que fez foi pintar uma mexa de seus longos cabelos negros com a cor vermelha. Isso era uma atitude Punk, isso é que é chocar a sociedade. “Essa hipocrisia de merda! Pro diabo vocês todos!” E, num acesso de revolta e ira, pegou do telefone e discou o número de Frederico:

Norma:
– Alô, Frederico?

Frederico:
– Oi, meu bem.

Norma:
– Meu bem o cacete, VAI SE FODER!!!

Frederico era retrógrado em demasia para que ela continuasse a perder seu tempo.

Numa crise de riso histérico ela deita-se novamente sobre a cama e continua a ouvir o cd.
A música que tocava era “Sheena is a punk rocker”, porém, o som que ecoava em sua mente dizia: “Norma is a punk rocker Now!”.



*Biografia: Amigo "emailístico" da "Bruníssima", filósofo nada lunático, que curte Led Zeppelin e Cat Power. Acha a "Lara" de Dr.Jivago muito mais bonita que a "Tonia" (e ai de quem discordar!!!); para ele "PG" é “País de Gales” e tem uma gatinha que usa um capacete de casca de laranja na cabeça.
É claro que tem a total simpatia de sua amiga Bruna, com quem partilha ideias, alucinações, desabafos e (por que não) xingamentos