Cos'è?



mercoledì 3 febbraio 2010

Maçã do Amor

A noite pesa sobre a cidade que adormece há muito tempo. No vigésimo terceiro andar de um prédio na Rua das Azaléias, uma luz amarelada emoldura a janela de um dos cômodos de um apartamento. Visto de longe, o lugar parece um pequeno vaga-lume a se destacar na escuridão. Lá dentro está Lia, vestida com calças de moletom, blusa apertada sem mangas e com um grande e fofo chinelo nos pés. Está a pensar em sua vida: em como era antes de Otávio e em como é agora, depois dele. De súbito, Lia acha que deve analisá-la em três partes completas: no antes, no durante e no depois.
Mas aonde a garota quer chegar com isto? Ela sabe que independentemente de sua conclusão, o que de fato valerá é que nada disto mudará em nenhum detalhe a sua vida. Otávio se foi. Antes dele, Augusto se foi também, assim como Márcio, Pedro, Luís e Cláudio se foram por sua vez. Cada qual a sua maneira deixou em Lia, marcas. Algumas destas são lembranças, outras são feridas e outras, nada mais do que palavras. Ah, mas o Otávio...
Otávio, o último namorado de sua vida até então. O último a quem Lia amou, mas o primeiro a que lhe vem à cabeça, agora. Otávio está a roubar-lhe os pensamentos, está tirando-lhe o sono, o sossego, a paz. Otávio, Otávio. Lia revira-se no sofá, abraça a almofada, suspira, fecha os olhos. “O que é mais importante: o primeiro amor, que fez nossos sentimentos brotarem ou o último amor, que ainda brota em nós, sentimentos?”. O último amor, sempre...
É por ele que Lia se debate, é por ele que seu coração se contorce. Otávio se foi e com ele, foram-se também os sonhos, os planos e a paixão. Não importa se depois dele virão o Antônio, o Júlio ou o Fábio... Lia sequer pensa nisto. O presente dói, o passado é mágico e o futuro é duvidoso. Em cima da mesa da cozinha, uma maçã mordida: vermelha e viva como a paixão. Uma maçã do amor. Otávio arrancou-lhe um pedaço com os dentes. Mordeu, mastigou e engoliu aquela pequena parte. Depois, abriu a porta da sala e saiu...sem mais voltar. Lia ficou naquele instante sozinha, desamparada, as lágrimas a molharem seus poros da face. Otávio, sem piedade, triturou em pedacinhos aquele amor. Agora, a marca de sua mordida estava ali, a amarelar-se com o passar do tempo. Ficará tão velha e murcha como as outras antigas lembranças. A maçã do amor foi atacada e minuto a minuto vai desbotando a sua cor. Nela, Lia ainda vê a sua parte em tonalidades fortes e brilhantes. De Otávio sobrou apenas a marca de sua boca, a saliva de seu beijo, o sabor de seu desamor.