Cos'è?



domenica 27 febbraio 2011

Quando sonhava acordada...



A noite estava agitada. Ela corria de homens armados que queriam prendê-la em um quarto imundo. Corria, corria, as pernas a pesarem sobre os pés, os homens a se aproximarem, de repente tropeçou, mas levantou-se rápido, olhou para trás, os homens ainda estavam ali, só que desta vez, tinham cachorros furiosos com eles. Como escaparei, como escaparei, pensava ela. Um muro alto estava a sua frente: não hesitou em tentar escalá-lo. Uma mão segurou-lhe o pé, que deu-lhe um chute no rosto. Caiu. Os homens a dominaram, os cachorros a mordiam aqui e ali. Tentou gritar. O grito foi abafado pelo próprio grito, só ela o escutava. De repente estava em uma casa, mas nesta casa não havia nenhum quarto imundo. Era uma casa estranha, com longas paredes alaranjadas, com uma escada em caracol e com muitas, mas muitas flores. Flores que recendiam o seu perfume em cada canto daqueles inúmeros cômodos. Uma mulher apareceu e elas se sentaram no sofá da sala e começaram a conversar- futilidades. "Eu cortei meu cabelo, mas fiquei com cara de caqui", dizia ela. "Cara de caqui? Pois olha, eu se fosse você, fazia logo uma balaiagem para melhorar este aspecto. Por que não vai na Nancy, ela é ótima?! Levei nela a Dolly, a minha poodle,na semana passada". "Na Nancy?! Ótimo! Bem lembrado. Vou buscar mais rosquinhas de nabo com pitanga para a gente", disse ela. E se levantou. Passou por um pequeno corredor até chegar à cozinha. Não se lembrava mais aonde tinha deixado as rosquinhas de nabo com pitanga, quando ouviu um barulho estranho. Ao abrir a porta da cozinha, deu de cara com as águas do mar a invadirem todo o seu quintal. Ondas rolavam pelo chão, fazendo chuá e aumentavam a densidade de água por ali. "Meu deus, o Tobias!!!", ela gritou. E entrou n'água para salvar o cãozinho que se afogava. Apenas a cabeça do animal aparecia por entre as águas do mar. Seu olhar transparecia solidão e desespero e ela logo o agarrou e conseguiu colocá-lo em uma cadeira que boiava por ali. "Ele está a salvo!", gritaram juntas três sereias que se exibiam na água. Suas caldas esverdeadas brilhavam intensamente, mas sem contrastarem com seus cabelos azuis. Flutuavam pela correnteza, todas com o corpo levemente inclinado, o braço direito dobrado a segurar suas cabeças mitológicas. "Há!há!há!há!", riam as sereias loucamente, causando vertigens nela que ainda estava na água. A água, por sua vez, era de uma imensidão assustadora e já não havia Tobias, nem quintal e nem porta de cozinha. Tudo desaparecera com a risada das sereias e agora era só ela naquele mar. As águas eram tão azuis quanto de uma piscina com cloro e tão macias que ela permanecia em sua superfície, sem querer pensar na profundidade daquele lugar. Sentiu uma baleia a passar por debaixo de seu corpo e viu aquele ser negro lá embaixo. Não teve medo. Começou a nadar, como se pressentisse o que estava prestes a vir: era sempre assim, ela já sabia. Não tardou a chegar uma grande,comprida, enorme e gigante onda, que escondeu todo o céu. Vinha com sua fúria em busca dela, queria pegá-la, atingi-la com sua potência, afogá-la em seu interior, pegá-la com sua superioridade, afundá-la em águas, sepultá-la em seu oceano para mantê-la sempre ali. A onda deslizava vagarosamente, não havia pressa em capturá-la. Ela nadava o quanto podia e debatia braços e pernas, virava a cabeça, uma pausa para respirar e soltar o ar na água. Socorro, socorro, o mar não tem fim. Olhou para trás e viu a onda imponente a preparar-se para derramar todo o seu poder em seu corpo. Tudo estava escuro e a onda foi caindo, caindo, caindo e ela caindo junto com a onda, a rolar, rolar, rolar até se ver em um telhado. No telhado encontrou uma máquina fotográfica e começou a tirar fotografias do sol. Era o sol mais amarelo que ela já havia visto, muito mais amarelo do que todos os amarelos juntos. Estava parado no céu no lado oeste, porém não demonstrava sinais de se pôr. Ela caminhou sobre o telhado e viu algumas pequenas flores cor-de-rosa nele. Sentou-se em frente a elas e brincou com seus pequenas pétalas. Seus caules tremiam de um lado a outro. Ela olhou novamente o céu e notou que ali, do lado leste, havia outro sol, tão amarelo quanto o primeiro. Sentiu vontade de chorar ao ver sóis tão belos a reinarem sobre aquele teto. Chorou, chorou até que o seu choro chamou a chuva, uma fina e fria garoa que começou a cair. Mas ela não sabia como descer daquele telhado, porque ao seu redor, só havia o céu, a chuva, as flores e os sóis. Não conseguia achar o fim do telhado para saber a qual altura estava. As telhas marrom-avermelhadas só empurravam para baixo a chuva, mas não lhe apontavam nenhum caminho. Começou a sentir frio e a desejar um guarda-chuva. Um uivo surgiu no telhado e era o vento que chegava. Ela cruzou os braços em frente ao corpo, os cabelos molhados a grudarem-lhe ao rosto, o corpo que reclamava do frio. Então o vento sussurrou bem forte em seus ouvidos: "Uuuuuhhhh..." e fez um rodopio em suas pernas. "Uuuuuhhhhh....", ele insistia e gritou ainda mais forte "Uuuuhhhh...." e arrancou uma a uma as florzinhas côr-de-rosa. O vento achou que ela era uma daquelas flores e a arrancou junto daquele telhado. Ela e as flores saíram a voar com o vento e percorreram muitos telhados por onde passavam, trombando em prédios e chaminés. Até que o vento cansou de falar e a deixou sozinha sem as florzinhas na entrada de um castelo. A porta do castelo se abriu e logo ali na entrada havia deliciosas amêndoas. Ela comeu todas que encontrou e seguiu em frente. Logo deparou-se com toda uma corte em reunião. "Não irei a Barenópolis", berrava um moço vestido em trajes de príncipe. "Então case-se comigo", dizia uma moça em trajes de princesa. "Só se houver um baile e muito farto de comida", bradou um homem que mais parecia um rei. E fez-se o baile subitamente. Príncipes e princesas rodopiavam por um grande salão em roupas de gala. Ela notou que também estava no meio dança e seu vestido era vermelho e elegante. Dançava com um homem alto, que segurava-lhe suavemente as mãos. Só que ela não conseguia ver-lhe o rosto e cada vez que se esforçava para distinguir-lhe as feições, mais ele a levava para cá e para lá, fazendo o seu cabelo balançar-se. Era bom dançar com ele e ouvir violinos ao fundo. Então, a fome apareceu e falou-lhe "olá!". Ela se lembrou do comentário do homem que parecia rei e correu até à mesa posta logo a frente. Arrancou uma suculenta coxa de frango e começou a mastigar. Comeu saladas, frutas e carnes e resolveu conferir às horas: 4h53.Tentou puxar da memória os afazeres daquele horário, mas como estava em seu quarto, não se importou muito. Passou esmalte vermelho nas unhas e abriu uma das janelas. Era outono. Sentou-se na poltrona e abriu um livro. Só conseguiu ler poucas páginas, porque um barulho a chamava cada vez mais alto. Alto, alto, alto e ela acordou. E logo começou a sonhar novamente. Gostava de sonhar acordada, porque era a única maneira de controlar os seus sonhos.