Cos'è?



mercoledì 12 gennaio 2011

...e os anjos choraram esta noite



Cem anos se passaram desde que Gaston Leroux (1868-1927) escreveu uma das obras mais inspiradoras do último século: o livro "O Fantasma da Ópera".
Fonte de devaneios para leitores, artistas e adaptadores, a história de um suposto fantasma que assombrava a Ópera de Paris em meados do século XIX também tem sua origem em um momento de sensibilização do autor: foi durante uma visita a este teatro, que Leroux ao se infiltrar por bastidores, salas e corredores, chega às partes mais baixas do lugar, descobrindo uma espécie de lago entre grades de ferro. O ambiente, iluminado apenas por uma tocha, ganhou proporções na imaginação e no talento do escritor francês, que também foi jornalista e estudante de Direito.
Para compor o seu mais famoso livro, Leroux utilizou-se de conhecimentos e habilidades vindos das áreas em que atuou. Assim, o romance, com ares de suspense em cada página, tem em sua narração elementos do jornalismo e da justiça-policial da época. Estes dois meios auxiliam a marcar as características de estilo do autor, que sempre pendem ao diferente, macabro e altamente misterioso. No livro "O Mistério do Quarto Amarelo" (1907) é possível notar esses seus traços de escrita.
Em "O Fantasma da Ópera" (Ed. Ática, 2006), logo nas primeiras páginas há explicações sobre o inusitado que se encontrará logo adiante. Os comentários são de um “repórter-escritor”, tal como o próprio Leroux fora, e sua maneira de abordar o mistério do Fantasma da Ópera conduz os pensamentos de quem o lê a uma situação "verídica", repleta da mais profunda importância para o meio social e que por isto, deve ser trazida a tona. O personagem- que se mistura com o próprio Leroux, ao se apresentar como autor do livro-, traz documentos e entrevistas em sua narrativa, além de dar o seu entendimento dos fatos. Porém, a maior parte do enredo é composta por falas de outros personagens, como bailarinas, cantoras, demais funcionários e frequentadores do teatro. Contada desta forma, o realismo da história aumenta a cada minuto, devido ao efeito do instantaneísmo.
Porém, tal artifício, ao mesmo tempo em que cria a ilusão no leitor de estar vendo muito dos fatos no momento em que acontecem, por outro lado, levam o autor a pecar ao ir revelando os mistérios em torno do "fantasma": muitas das revelações ganham ares infantis e simplórios na boca dos personagens, como no momento em que a cantora Christine Daaé conta ao seu amado, o visconde Raoul de Chagny sobre algumas das peripécias de Erik, o Fantasma. Se a ideia foi mesclar a pureza infantil com a frieza da mente adulta, o resultado final não atingiu o objetivo de manter uma narrativa instigante e envolvente o tempo todo, pois não sacia o leitor em alguns dos pontos-chaves do texto. Este, já sensibilizado com a romântica ideia de um "Anjo da Música", tem ainda mais sede em saber da verdadeira identidade do “fantasma”, entretanto, não espera que as revelações deem-se de forma clara, objetiva e óbvia nos próximos capítulos. A simplicidade do descobrimento desaponta o leitor, que esperava por algo mais maduro para a situação.
Para aqueles que estão acostumados a ver as grandes produções musicais no teatro e no cinema da obra, não imaginam o quanto o escritor se preza de adjetivos para caracterizar personagens, lugares e situações. Erik e sua aparência horrenda é sem dúvida, a mais marcante descrição em todas as páginas. Por outro lado, as adjetivações originam vertentes na mente do leitor, que passa a refletir sobre a real personalidade do fantasma e sobre os sentimentos de Christine por ele.
Ao se ressaltar o papel de cada personagem na narrativa, Leroux define bem a importância de atuação de cada um deles na trama. É preciso que existam as inocentes bailarinas, como Jammes e Meg para assombrarem ainda mais a aparição de um "fantasma", como também é necessário que haja diretores céticos, para se contraporem aos pensamentos das artistas. Mais uma vez, são fundamentais as presenças da lanterninha Sra Giry, em sua "amizade" com a "caveira de olhos de fogo", além do enigmático Persa, peça-chave na explicação do mistério em torno de Erik e até mesmo criaturas como Joseph Buquet, o enforcado, e o Sr. Daaé merecem destaque por acrescentarem detalhes vitais na história como um todo. Quando se costura fatos a personagens, corre-se menos riscos de se ter uma trama com buracos, com pequenos enganos que raramente passam despercebidos aos olhos de quem a lê.
O clima de mistério e sombras que Leroux desenvolve no decorrer da história não é muito similar com relação a algumas de suas adaptações no teatro e no cinema. Principalmente nas mais recentes (como nos musicais apresentados na Broadway e no último filme lançado em 2004), as novas versões prendem-se mais ao triângulo amoroso entre Christine, Raoul e Erik, romantizando ao extremo o enredo, que nada mais possui do "relato jornalístico" do livro. Se não bastasse, também minimizam a postura tida como cruel de Erik, que adquire ares ainda maiores de piedade por parte do público. Como ocorre em muitas adaptações, em "O Fantasma da Ópera", várias situações e personagens originais têm ou seus papeis suprimidos ou alterados. O filme de 1925 baseado na obra, com Lon Chaney interpretando Erik é considerado por muitos como um dos pioneiros nas histórias cinematográficas de terror.
O trecho a seguir do livro, relata o instante em que Raoul flagra Christine conversando com uma voz misteriosa. Até aqui, não se sabe nada além disto:
"A voz de homem fez-se ouvir novamente:
-Você deve estar cansada.
-Oh! Esta noite eu lhe dei a minha alma e estou morta.
-A sua alma é muito bela, minha menina- replicou a voz grave de homem-, e eu lhe agradeço. Não há imperador que tenha recebido presente igual! Os anjos choraram esta noite.”

O livro "O Fantasma da Ópera" fez 100 anos de lançamento em 2010